Há 44 anos, o primeiro governador
eleito do Acre foi deposto
Esta quinta-feira não é um dia qualquer no calendário.
Foi exatamente no dia 8 de maio de 1964 que o primeiro governador constitucionalmente eleito pelo povo acreano, José Augusto de Araújo, foi deposto do cargo numa ação orquestrada pelo capital Edgar Pedreira Cerqueira Filho, que contou com a cumplicidade da Assembléia Legislativa.
Na foto, o governador aparece ao lado do então deputado Maria Maia, que também foi vítima da ditadura.
Nos dias de hoje, a Assembléia Legislativa é presidida por Edvaldo Magalhães, um comunista convicto.
Há 44 anos, o governador José Augusto foi deposto justamente porque os militares e deputados lhe acusaram injustamente de ser comunista. São coisas como essas que reforçam o preço alto da democracia.
José Augusto de Araújo foi eleito com apenas 32 anos. Ganhou com o slogan “O Acre para os acreanos”. Implementou algumas medidas ousadas, que bateram de frente com a oligarquia política e econômica local. Foi triplamente golpeado. Sofreu golpe do seu partido (PTB), da Aleac e dos militares.
Em fevereiro de 1964, o governador se ausentou do Estado para fazer tratamento de saúde no Rio de Janeiro. Teve que voltar mais cedo porque a situação política no Acre não lhe era favorável.
No dia 8 de maio, às 14h35, mandou telegrama ao comandante da 8ª Região Militar, em Belém, onde dizia conhecer as denúncias feitas contra ele pelos deputados Aluízio Queiroz e Eloy Abud, ambos do PSD. Negou ser comunista. Foi um dos seus últimos atos. Às 21 horas do mesmo dia entrega a carta de renúncia..
Mesmo incentivado a reagir, o governador preferiu evitar o derramamento de sangue. Fez uma carta de renúncia simples. Leia o teor: “De acordo com a alínea B, item II, do Artigo 24, da Constituição do Estado, comunico a esta Assembléia que, nesta data, renuncio ao cargo de governador do Estado do Acre, para o qual fui eleito em 7 de outubro de 1962”.
Os deputados estavam combinados com Edgar Cerqueira. É tanto que a Aleac ficou em sessão permanente desde as 14 horas do dia 8 de maio. Todos os segmentos econômicos, oligárquico e políticos estavam empenhados na deposição do governador eleito.
O primeiro ato que confirmou a preparação prévia para a cassação de José Augusto foi encenado quando o então presidente da Aleac, José Ackel Fares, abriu a sessão para pôr em votação a Emenda Constitucional nº 3, que propunha a eleição, em dois dias, de um governador, em caso de vacância. A matéria fora aprovada em dois turnos, em meio a muito constrangimento.
Às 22 horas, o deputado Geraldo Reis Fleming leu a carta renúncia de José Augusto de Araújo. Em seguida, José Ackel Fares comunicou que recebeu, por meio dos líderes de bancada, o nome de Edgar Pedreira Cerqueira como candidato a governador.
O militar foi eleito indiretamente por deputados do PSD e PTB. A sessão foi encerrada às 23h40. O governador da ditadura assumiu no dia seguinte, às 11 horas. Começou ali uma das fases mais escuras da nossa história.
Um dia após a renunciar, José Augusto viajou para o Rio de Janeiro. Em 1965, retornou ao Acre. Foi preso. Passou sete meses prestando esclarecimentos em processos abertos por Edgard Cerqueira. Nesse período teve que ser internado no Hospital de Base de Rio Branco, em estado grave, acometido por infarto.
Retornou ao Rio e recebeu outra intimação para depor, desta vez, em Belém, onde permaneceu dois meses e sofreu outro infarto. No leito do hospital que recebeu notícia de sua cassação do mandato e dos seus direitos políticos por 10 anos.
Edgar Cerqueira deixou claro, logo no discurso de posse, que não admitiria ser contrariado. O curioso é que deputados que lhe deram apoio passaram a ser perseguidos, sob a acusação de serem comunistas.
Nascido em Cruzeiro do Sul em 1930, José Augusto teve uma carreira política meteórica. Quando estudava História do Rio de Janeiro, chegou ao cargo de secretário-geral da UNE. Ingressou na política partidária somente 1958, quando ficou na suplência de deputado federal. Em 1960, assumiu o mandato por quatro meses, quando aproveitou para se projetar.
Se ainda fosse vivo, José Augusto de Araújo completaria 78 anos no dia 3 de julho. Mas morreu cedo. Seu coração não resistiu tanta pressão. Morreu no dia 3 de abril de 1971, no Rio de Janeiro. Tinha apenas 40 anos.
Para encontrar fundamentação suficiente sobre o período de cassação do governador José Augusto de Araújo, o editor do blog pesquisou no texto “O golpe militar no Estado do Acre, Brasil: denuncismo, fragilidade democrática e hipertrofia do Executivo”, de autoria do professor do Departamento de História Ufac Francisco Bento da Silva. Vale a pena fazer uma boa leitura do material. O professor Marcos Vinicius Neves também colaborou.
Esta quinta-feira não é um dia qualquer no calendário.
Foi exatamente no dia 8 de maio de 1964 que o primeiro governador constitucionalmente eleito pelo povo acreano, José Augusto de Araújo, foi deposto do cargo numa ação orquestrada pelo capital Edgar Pedreira Cerqueira Filho, que contou com a cumplicidade da Assembléia Legislativa.
Na foto, o governador aparece ao lado do então deputado Maria Maia, que também foi vítima da ditadura.
Nos dias de hoje, a Assembléia Legislativa é presidida por Edvaldo Magalhães, um comunista convicto.
Há 44 anos, o governador José Augusto foi deposto justamente porque os militares e deputados lhe acusaram injustamente de ser comunista. São coisas como essas que reforçam o preço alto da democracia.
José Augusto de Araújo foi eleito com apenas 32 anos. Ganhou com o slogan “O Acre para os acreanos”. Implementou algumas medidas ousadas, que bateram de frente com a oligarquia política e econômica local. Foi triplamente golpeado. Sofreu golpe do seu partido (PTB), da Aleac e dos militares.
Em fevereiro de 1964, o governador se ausentou do Estado para fazer tratamento de saúde no Rio de Janeiro. Teve que voltar mais cedo porque a situação política no Acre não lhe era favorável.
No dia 8 de maio, às 14h35, mandou telegrama ao comandante da 8ª Região Militar, em Belém, onde dizia conhecer as denúncias feitas contra ele pelos deputados Aluízio Queiroz e Eloy Abud, ambos do PSD. Negou ser comunista. Foi um dos seus últimos atos. Às 21 horas do mesmo dia entrega a carta de renúncia..
Mesmo incentivado a reagir, o governador preferiu evitar o derramamento de sangue. Fez uma carta de renúncia simples. Leia o teor: “De acordo com a alínea B, item II, do Artigo 24, da Constituição do Estado, comunico a esta Assembléia que, nesta data, renuncio ao cargo de governador do Estado do Acre, para o qual fui eleito em 7 de outubro de 1962”.
Os deputados estavam combinados com Edgar Cerqueira. É tanto que a Aleac ficou em sessão permanente desde as 14 horas do dia 8 de maio. Todos os segmentos econômicos, oligárquico e políticos estavam empenhados na deposição do governador eleito.
O primeiro ato que confirmou a preparação prévia para a cassação de José Augusto foi encenado quando o então presidente da Aleac, José Ackel Fares, abriu a sessão para pôr em votação a Emenda Constitucional nº 3, que propunha a eleição, em dois dias, de um governador, em caso de vacância. A matéria fora aprovada em dois turnos, em meio a muito constrangimento.
Às 22 horas, o deputado Geraldo Reis Fleming leu a carta renúncia de José Augusto de Araújo. Em seguida, José Ackel Fares comunicou que recebeu, por meio dos líderes de bancada, o nome de Edgar Pedreira Cerqueira como candidato a governador.
O militar foi eleito indiretamente por deputados do PSD e PTB. A sessão foi encerrada às 23h40. O governador da ditadura assumiu no dia seguinte, às 11 horas. Começou ali uma das fases mais escuras da nossa história.
Um dia após a renunciar, José Augusto viajou para o Rio de Janeiro. Em 1965, retornou ao Acre. Foi preso. Passou sete meses prestando esclarecimentos em processos abertos por Edgard Cerqueira. Nesse período teve que ser internado no Hospital de Base de Rio Branco, em estado grave, acometido por infarto.
Retornou ao Rio e recebeu outra intimação para depor, desta vez, em Belém, onde permaneceu dois meses e sofreu outro infarto. No leito do hospital que recebeu notícia de sua cassação do mandato e dos seus direitos políticos por 10 anos.
Edgar Cerqueira deixou claro, logo no discurso de posse, que não admitiria ser contrariado. O curioso é que deputados que lhe deram apoio passaram a ser perseguidos, sob a acusação de serem comunistas.
Nascido em Cruzeiro do Sul em 1930, José Augusto teve uma carreira política meteórica. Quando estudava História do Rio de Janeiro, chegou ao cargo de secretário-geral da UNE. Ingressou na política partidária somente 1958, quando ficou na suplência de deputado federal. Em 1960, assumiu o mandato por quatro meses, quando aproveitou para se projetar.
Se ainda fosse vivo, José Augusto de Araújo completaria 78 anos no dia 3 de julho. Mas morreu cedo. Seu coração não resistiu tanta pressão. Morreu no dia 3 de abril de 1971, no Rio de Janeiro. Tinha apenas 40 anos.
Para encontrar fundamentação suficiente sobre o período de cassação do governador José Augusto de Araújo, o editor do blog pesquisou no texto “O golpe militar no Estado do Acre, Brasil: denuncismo, fragilidade democrática e hipertrofia do Executivo”, de autoria do professor do Departamento de História Ufac Francisco Bento da Silva. Vale a pena fazer uma boa leitura do material. O professor Marcos Vinicius Neves também colaborou.
6 comentários:
Prezado Leonildo,
Parabéns pelo Blog e palas postagens sobre a história do Acre.
Olhando esta foto do Governador José Augusto, ao lado do Mário Maia, estalou na minha lembrança um fato ocorrido alguns poucos anos depois.
É sabida a forma grotesca como José Augusto foi tangido de sua cadeira de governador eleito. Posso abreviar dizendo uma expressão muito antiga e verdadeira: saiu apenas com a roupa do corpo. De riqueza, a mulher e dois filhos.
Os pertences pessoais, com certeza, também foram levados, exceto um pequeno acervo que, não me perguntem como, foi parar numa das salas da Assembléia Legislativa, mais precisamente na sala do diretor geral da Casa.
Aqueles livros ficavam ali no canto. Ninguém mexia ou limpava, como se à espera do dono estivessem. Não era muita coisa não. Cabiam em uma estante, mas ficavam ali, intocados. Se por respeito ou por desprezo, também não sei afirmar.
Certo dia, numa ausência breve do diretor, um funcionário de carreira assumiu seu lugar. Primeira providência: limpar a sala, espanar os móveis, passar óleo de peroba e... dar fim naquela "tralha".
Tomei a providência, não sem antes dar uma olhada nos tais livros e recortes de jornais da época. Tinham uns títulos que não me interessaram. Muitos traziam anotações e sublinhados. Dois, talvez os menores e mais simples, sem capa dura, sem letras douradas, chamaram minha atenção e, de forma muito reservada, levei para casa e comigo ficaram durante um bom tempo. Eram: Doenças e Medicamentos Indígenas (não lembro o autor, só que era estrangeiro) e A Lenda do Mapinguary, de Amâncio Leite, Cruzeiro do sul, início do século (1906, se não me falha a memória).
O A Lenda do Mapinguary, além da própria lenda, trazia duas peças que considero maravilhosas, intituladas Pai Nosso do Seringueiro e Ave Maria do Seringalista (ou seria Pai Nosso do Seringalista e Ave Maria do Seringueiro?). Desse, fiz várias cópias e doei para amigos, entre os quais o Elson Martins. Os dois originais doei para o jornalista Edilson Martins, à época, apaixonado pelas questões indígenas. Com certeza estão guardados como tesouros.
Agora, aos sessenta anos, com raiva de mim, constatei que obedeci uma ordem errada, de um chefete errado, que estava no lugar errado. De certo, só a ditadura e a obrigação de obedecer.
Leonildo, esqueci de dizer que, no amontoado de livros jogados no lixo, existiam também uns títulos que pertenciam ao Doutor Carlos Mexeira Afonso.
Prezado leonildo, parabéns pela lembrança da fatídica data (ara José Augusto e o Acre), pois ainda hoje poucos conhecem os bastidores que levaram ao golpe que à época foi chamado de renúncia. Creio que pela importância, estes acontecimentos mereceria uma reportagem especial. abraços, Francisco Bento
bem, esqueci de sugerir no e-mail anterior: se quiser, você pode disponibilizar o meu texto para que quiser baixá-lo. Francisco Bento
Caro Leonildo,
Quero cunprimentá-lo pela iniciativa de falar sobre José Augusto de Araújo, primeiro governador eleito constitucionalmente pelos acreanos.
Lembro-me de visitá-lo com meus pais, se não me engano, em um apartamento localizado na SQS 114, em Brasília.Tinha a fisionomia extremante abatida, de tristeza tão profunda que guardo aquela imagem até os dias de hoje.
José Augusto, por tudo que sofreu, por sua tragetória, precisa ser conhecido por outras gerações, que dessa forma terão a oportunidade de conhecer parte da história política do Acre.
Regina Lino
Caro Leonildo,
Acabo de ler sua rezenha sobre a deposição do Governador José Augusto de Araújo (meu xará),de quem fui Assessor particular, além de Oficial de Gabinete da Casa Civil.Fui o redator das duas pobres e pálidas do Ofício passado ao Cap.Sebastião, da Casa Militar e redator das Atas de vacância do Cargo de Governador,de Posse do Dep. J.Akel no aludido posto ,de Transmissão de encargo e finalmente de posse do Capitão Edgard Pedreira de Cerqueira Filho, com quem permanecí por mais brabos três meses, quando, a 13.08.64 consegui
minha redentora transferência para a Representação do Acre em Manaus.Esse militar gostava, realmente, de mostrar as garras cruéis da tirania. Um dos momentos de seu autoritarismo, mesmo sendo de certo modo hilário, tem o caso do discurso que obrigou-me a redigir há exatos treze minutos para pousar em Cruzeiro do Sul, quando de sua primeira viagem aos municípios. De início pensei tratar-se de uma brincadeira comigo, que estava sentado ao lado de minha namorada (uma das datilógrafas do Gabinte). O caso era sério: redigí,fui o primeiro a desembarcar,dirigir-me à Prefeitura e datilografar o tal discurso, fato que concluí exatamente na chegada
da Comitiva do local. Em compensação procurei vingar-me. Como não havia xerox na cidade, pedí à Madalena que datilografasse mais três vias para os dias seguintes (Tarauacá, Feijó e Sena Madureira), o que viria fazer acabar decorando o tal discurso que só diferenciava o cabeçalho: Povo de.....(tal lugar). Mas o histórico do Chico Bento é, realmente, de alta fidelidade e você, embasado na queles dados, trouxe como muita propriedade um fato que, apesar de sórdido, absurdo e cruel, faz parte das Histórias, não apenas do Acre, mas também do Brasil (já que o Acre é o único Estado que é brasileiro por opção).
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