quinta-feira, 17 de abril de 2008

O caminho do parlamento
não passa pela educação

Gina Menezes*

No Instituto Superior do Acre há um aluno que tem no rosto um brilhante sorriso estampado por ter ganhado uma bolsa de estudos. Na Assembléia Legislativa do Acre há um deputado que raramente sorri e que fomenta seus discursos na apologia à ignorância.

O nome do estudante não cabe aqui porque ele ainda carrega o anonimato de quem está começando a vida. O outro é o deputado Juarez Leitão, primeiro secretário da mesa diretora da Aleac. Os dois têm muitas coisas em comum e apenas uma diferença: um luta pelo direito de estudar e o outro afirma que faculdade não lhe faz falta.

Para o acadêmico do Iesacre estudar é o passaporte para uma vida melhor. Ele escreve de forma brilhante e tem um português impecável. Ganhou um computador em um concurso de redação. Nem pensou duas vezes em oferecer o equipamento para quitar parcelas atrasadas da faculdade. Jura de pés juntos que o sacrifício em nome da educação vale a pena.

O menino sonhador ficaria desanimado se encontrasse pela frente o deputado Juarez Leitão, que se orgulha de não ter estudado e garante que não precisa de faculdade para conseguir seus ideais. “Não tem faculdade para ser deputado”, diz Juarez, justificando seus erros de concordância nominal e mostrando uma ignorante alegria por ser deputado pelo Acre sem precisar estudar.

Difícil saber quem está com a razão, se é o menino sonhador bolsista que anda de ônibus, mas que não faz vergonha quando abre a boca, ou o deputado petista, que anda de picape cabine dupla, já foi líder do PT na Aleac, mas não consegue o feito de dizer uma frase inteiramente correta.

Juarez e o acadêmico que ainda não registrou seu nome na história têm em comum o fato de terem nascido pobres e sem oportunidades. De diferente eles têm a reação em frente aos livros.

O acadêmico se abraça às palavras como se fossem uma tábua de salvação em mar aberto, talvez seja mesmo. Juarez rejeita a educação, os livros e os intelectuais como se fossem alguma pestilência. “Falo a linguagem do povo. Não tem porque falar tudo certo”, diz o homem da célebre frase “Eles Veve muito bem do jeito que está” (Sic). Nem sei quem o deputado queria dizer que vivia bem, quem não fica bem com isto são gerações futuras que herdarão do parlamento a lição de que não precisa estudar para desempenhar função pública.

O aluno do Iesacre se matriculou no curso com a firme convicção de que pagaria o preço que fosse para se manter na faculdade. Ele não titubeou em abrir mão do primeiro computador que ganhou na vida. Era um bem material em troca de um sonho que não tem preço. Reagiu à falta de oportunidade se agarrando à academia.

Juarez reagiu à falta de oportunidade negando o que momentaneamente não podia ter. Não pôde estudar quando quis e não quis estudar quando pôde. Juarez bateu o pé como menino buchudo e esfrega o mandato na cara de quem duvida da sua capacidade. Eu não duvido da falta de capacidade de realização do deputado, mas a falta de perseverança e a falta de apego à educação é algo gritante na biografia de Leitão.

Dizem os filósofos que a nossa história é uma eterna interação e que não existe fato isolado. Bem sabia que Romildo Magalhães, ex-governador do Acre, tinha deixado uma colaboração negativa para a educação do Estado, só não sabia que era atemporal e nem sabia que ele tinha gerado um deputado que faz apologia à falta do saber.

Que pena que quando o bem intencionado Juarez Leitão, aos 14 anos, foi tentar a sorte em Feijó em busca de estudos se esbarrou com Romildo Magalhães como prefeito.

Romildo lhe entregou uma enxada para trabalhar e lhe roubou um sonho. O sonho de poder estudar. Juarez não aceitou a enxada para limpar as ruas de Feijó, mas também não teve de volta o sonho da educação. Voltou para o seringal e para a certeza de que educação não é indispensável.

Anos depois, Juarez saiu das matas e chegou à Aleac para sempre livre do pesadelo de ter uma enxada nas mãos e para o resto da vida com a marca de não ter compreendido realmente o valor da educação. Pobre do Juarez que entregou o sonho a Romildo e lamentável o Leitão que faz apologia à falta do saber.

Destes dois deputados que dentro do petista amigo de Marina e de Chico eu não prefiro a nenhum. Prefiro mesmo ao acadêmico do Iesacre que não abriu mão do sonho de estudar nem mesmo quando as mensalidades atrasadas começaram a bater a sua porta. Queria apenas que o acadêmico valente e amante das letras fosse até a Aleac e sussurrasse para Juarez Leitão a frase de Monteiro Lobato que diz que um país se faz com homens e com livros.

* Gina Menezes é jornalista do jornal O Rio Branco

Comentário do editor: Devo dizer que não concordo com todos os termos empregados contra o deputado Juarez Leitão. Nutro por ele a sua história um respeito grande. Não é qualquer um que consegue chegar onde chegou o parlamentar. É um homem que veio ter contato com um telefone convencional quando tinha mais de 20 anos. Conhece boa parte dos países e tem uma trajetória de luta em defesa do meio ambiente e dos povos da floresta. O conhecimento acadêmico é importante, mas não podemos ignorar aquilo que é adquirido empiricamente.

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